Rumo ao abismo
Carlos Scheid
Não. Não sou pessimista. Nem profeta do caos. Apenas ligo a TV, passeio pelas redes sociais, ouço as novas (tão velhas!) de Brasília e de Paris, e não posso ignorar o óbvio: caminhamos para o abismo.
Em sua raiz grega, “abismo” designa algo sem fundo. Tem vários sinônimos: voragem, vórtice, despenhadeiro. Mas prevalece a ideia de uma queda, um mergulho vertical em relação ao fundo, o mundo inferior, infernal.
A palavra abismo permite outras conotações igualmente assustadoras: desastre iminente, situação fora de controle, calamidade inevitável. Em nosso caso, o abismo é o ponto de chegada de uma sociedade que perdeu a alma.
Desde que a organização social passou a ser vista como simples epifenômeno dos dados econômicos, desde que o dinheiro, a posse e o lucro - e não o homem - se tornam a medida de todas as coisas, logo se percebem os reflexos na estrutura da família, nas relações de trabalho, nos objetivos pessoais.
Não precisamos de estatísticas – bastam os cinco sentidos – para avaliar que chegamos ao ponto de não retorno. O desequilíbrio ambiental e o caos social o confirmam. O Estado se mostra incapaz de reger o sistema apoiado apenas em números e teorias econômicas. Isto quer dizer que teremos, aqui e ali, pequenos e médios apocalipses, antes de algum apocalipse planetário.
Esta é visão humana. A visão do homem material – homem “carnal”, diria o apóstolo Paulo. Neste panorama, o homem conta apenas com suas próprias forças... e suas próprias fraquezas... E não existe saída.
Mas a palavra abismo pode ser invertida. Pode apontar para o alto. Como escreveu o salmista, “abyssus abyssum invocat” [o abismo chama pelo abismo, Sl 42,7]. Muito maior que o abismo humano é o abismo divino, o abismo da divina misericórdia. Mesmo ignorado pelo filósofo positivista, um Criador subsiste nas entranhas do Cosmo – para não dizer que é o Cosmo a subsistir nas entranhas de seu Criador. E o Criador ama sua Criação. Não ficará inerte diante de sua destruição.
Aqui está a segurança que somente a fé pode oferecer à humanidade sem rumo. Existe um abismo de amor cuja potência e dinamismo superam a sífilis do capital, ira do átomo e a fome dos buracos negros.
Estamos perto do fim. E no fim, o Amor vencerá...