Passado um mês do início do meu pastoreio junto ao Povo de Deus que na Igreja Particular de Leopoldina, percebi que uma das tônicas na relação entre bispo e sacerdotes é a questão referente às nomeações e transferências. Muitos padres, até com comoção, expressam seus sentimentos: “Sr. Bispo! (interjeição indelével). O senhor pretende me transferir? Não estou satisfeito! Não entendi minha transferência anterior: acho que foi uma punição. Estou sofrendo muito!”. Outros, ainda: “Sr. bispo, estou à disposição da Igreja, mas peço, apenas, que não me transfira, pois estou satisfeito na atual paróquia”.
Partindo de minhas experiências anteriores, como membro do presbitério da arquidiocese de Pouso Alegre e bispo auxiliar em Belo Horizonte, bem como da partilha de tantos padres e bispos amigos, concluo que não se trata de uma questão local, mas que atinge toda a Igreja. Se, por um lado, apresenta-se como circunstância de sofrimento e instabilidade, tanto para o sacerdote quanto para a comunidade, seja paroquial ou diocesana, por outro, é ocasião para questionarmos e refletirmos acerca dos critérios que a Igreja apresenta e que podem minimizar tais dificuldades.
O Código de Direito Canônico, fala sobre a estabilidade no exercício do múnus paroquial: “É necessário que o pároco tenha estabilidade e, portanto, seja nomeado por tempo indeterminado; só pode ser nomeado pelo bispo diocesano, por tempo determinado, se isto for admitido por decreto pela conferência dos bispos” (cf. CDC, 522). Também o documento conciliar Christus Dominus (CD), n. 31, fala de estabilidade para o pároco. Além disso, trata-se de um elemento amadurecido na tradição canônico-pastoral da Igreja.
Por outro lado, a estabilidade canônica não é sinônimo de intangibilidade, menos ainda de perpetuidade em um ofício. A transferência dos párocos é válida e legítima se o bem das almas, a necessidade ou a utilidade da Igreja exigirem, observado o procedimento previsto em lei (cf. CDC, cân. 1748-1752). Sua destituição também é prevista, em determinadas situações (cf. CDC, cân. 1740-1747). A transferência, muitas vezes, é oportunidade para a dinamização das comunidades e enriquecimento da própria missão dos sacerdotes.
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, na legislação complementar ao cânon 522, dispôs que, por justa causa, o bispo diocesano pode nomear párocos por períodos determinados, não inferior a seis anos, sempre renovável. Tal orientação é, muitas vezes, mal interpretada, pois não dispõe sobre um máximo de tempo para o exercício do ofício de pároco, mas do tempo mínimo para o qual o bispo pode nomeá-lo. É necessário sensibilidade para não ferir o princípio de estabilidade com a mentalidade de “mandato” de seis anos para o pároco.
A nomeação e transferência de sacerdotes, particularmente no oficio de pároco, não deve ser feita arbitrariamente, pelo único critério da vontade do ordinário local, nem tão pouco simplesmente para atender expectativas do nomeado ou transferido ou ainda das comunidades: “O bispo diocesano, evitando qualquer discriminação de pessoas, entregue a paróquia vacante àquele que julgar idôneo para desempenhar nela o cuidado paroquial; a fim de julgar de sua idoneidade, ouça o vigário forâneo e faça as devidas indagações, ouvindo, se for o caso, determinados presbíteros e fiéis leigos (cf. Cân. 524)”.
O Cânon 524 nos faz perceber que, na dinâmica de uma eclesiologia de comunhão, quatro aspectos devem ser levados em conta na transferência e nomeação de sacerdotes, particularmente para o ofício de pároco: considerar a idoneidade/capacidade do sacerdote para a função; escutar o parecer do vigário forâneo; escutar o parecer de determinados presbíteros e a escuta dos fiéis leigos:
Estes critérios recordados pelo Cân. 524 são de suma importância para que o bispo, os sacerdotes e as comunidades paroquiais, superando o risco de fissuras, dissenções e traumas, façam um discernimento conjunto, na dinâmica da comunhão, corresponsabilidade e diocesaneidade, transformando as nomeações e transferências em instrumento de unidade e aprimoramento da evangelização, tendo por modelo ideal o coração de Cristo, o Bom Pastor.
* Bispo da Igreja Particular de Leopoldina – MG